O post hoje não é sobre as coisas divertidas ou engraçadas, nem sobre aventuras em uma culinária estrangeira, como eu pensei a princípio em escrever. É sobre um sentimento que, acredito que muitos viajantes sentem, o de ser "estrangeiro". De estar sozinho.
Eu sou uma pessoa gregária, do tipo que adora uma casa cheia, então tem sido complicado estar num lugar em que, literalmente, conheço meia dúzia de pessoas. Mas eu vinha lidando bem com isso, com ajuda da internet e uma visão aventureira da coisa. Essa semana eu experimentei pela primeira vez a sensação de estar fora do meu ambiente e do que é viver sem um sistema de suporte.
No domingo do dia dos pais, meu marido precisou ir para Potosí devido aos tumultos que estavam começando naquela cidade. Greve geral, mineiros invadindo a sede da mineradora, piquetes nas estradas e desabastecimento ameaçavam o funcionamento de tudo. Só que nenhum de nós tinha a menor ideia do que realmente estava acontecendo na cidade. O Governo de Evo Morales não é exatamente um primor de informações e sua única atitude no conflito foi dizer que...não tomaria atitude nenhuma.
Na verdade os problemas desse país são muito semelhantes aos do Brasil: a Bolívia é um país rico, com minérios abundantes, mas seu povo é pobre. Seus políticos são demogogos e a população é carente de tudo. A Greve em Potosí era uma revolta de uma cidade que está sentada em uma verdadeira mina de dinheiro, mas que não vê nem um centavo sendo devolvido para seus cidadãos e cujos trabalhadores tem condições de trabalho muito ruins. Além claro, de uma oportunidade para piqueteiros e politiqueiros ganharem algum.
Eu fiquei dois dias sem contato com meu marido. Ilhado em uma cidade que nos melhores dias, já tem sérias dificuldades com as comunicações, meu marido não conseguia contato com o chefe e nem comigo. E eu, que já me achava acostumada a essas situações (seu trabalho as vezes o deixa quinze, vinte dias em lugares ermos e distantes) percebi o quanto é diferente quando você não tem uma rede de apoio.
É a sensação do estrangeiro. Sem família próxima, sem as mulheres dos outro trabalhadores para dividir as preocupações, em lanches que tentam nos deixar tranquilas, e com um chefe que eu vi apenas duas ou três vezes antes. Sem aquele monte de telefones de amigos e parceiros de trabalho para quem você pode ligar, e no mínimo dividir a ansiedade. Eu me senti pela primeira vez, no estrangeiro.
Ele voltou, são e salvo, sem dormir por dois dias e morto de frio depois de passar uma noite na estrada dentro do carro, a quase 4000m de altitude. Eu? Roí todas as unhas, mas encontrei, nas três outras famílias de brasileiros da empresa, um pequeno novo grupo de suporte. Como foi bom ouvir o som do português naquele momento, a cadência melosa do sotaque baiano da Nana, esposa de um dos trabalhadores que estava no carro com meu marido. Comer acarajé aqui na Bolívia! E descobrir uma rede de contrabando do bem, que já está intimada a me conseguir feijão preto e chokito na próxima encomenda.
Uma vez eu li que de todos os povos, ninguém sente mais falta de sua terra que o Brasileiro. Portugueses nasceram para o mar, britânicos reclamam mas são cidadãos do mundo, franceses seduzem todos e Italianos amam a aventura. Mas brasileiros? Viajam pelo prazer de voltar para sua terra e descobrir que ainda é o melhor lugar do mundo.