sábado, 9 de outubro de 2010
Post By: Lilah
O meu primeiro contato com o amor foi um puxão de cabelo e um dente perdido. Calma, isso não é um relato de abuso doméstico. Eu tinha só três anos e meu príncipe encantado tinha cinco. Ele puxou meu rabo de cavalo e eu, que não levava desaforo para casa nem quando usava fraldas, usei um baldinho cheio de areia para retaliar. Saldo final do nosso encontro ele perdeu o dente da frente e eu devo ter ganho uma bela bronca. Nossas mães contaram essa história por anos a fio.
Nós morávamos na mesma rua. Estudávamos na mesma escola, só alguns anos separados. Depois daquele início difícil nós viramos amigos. Quer dizer, ele virou meu protetor. E eu confesso que deve ter sido um trabalho terrível, por que eu era a caçula de cinco meninas e meu pai resolveu que, se o filho homem não vinha, eu ia ter que ocupar o lugar. Então eu jogava bola, brigava com os meninos e chutava canelas. E quando a coisa apertava e eu não podia chamar papai...eu gritava por ele.
Ele me deu o primeiro beijo aos doze anos. Debaixo de uma mangueira, no fundo da rua. E por dois anos e meio nós namoramos para a felicidade geral da nação. Quer dizer, felicidade geral do meu pai e da minha mãe. Já que existia alguém para tomar conta de mim e eu não tinha me tornado um moleque completo. Ele dançou a valsa nos meus 15 anos. E ninguém da festa sabia, que naquele mesmo dia de manhã, nós havíamos terminado. Ele posou para as fotos do alto da sua enorme maturidade de 17 anos e não existe nenhuma foto no álbum em que ele não esteja sorrindo estoicamente.
Eu? Eu cansei do menino bonzinho da porta ao lado. Eu queria aventura e não segurança. Asas e não pé no chão. Ele? Nasceu com 25 anos. Semanas depois eu conheci o pai dos meus dois filhos mais velhos. Badboy da escola, ele pilotava uma moto, andava com meninos mais velhos e vestia jaquetas de couro. Meu pai disse não, de jeito nenhum. E eu bati pé e mimada como era, fugia nas tardes de aula para namorar o carinha por quem todas suspiravam.
O fim da história é previsível. Eu engravidei e fui mãe aos dezesseis. Nós dois casamos, muito mais por pressão do meus pais e dos pais dele, preocupados com o fato que eu era menor e meu pai um homem muito bravo. Mas Isaac e eu não ficamos juntos por muito tempo. Menos de dois anos depois eu voltava para casa, com um bebê no colo e outro a caminho.Voltava para a mesma rua, com aquela mesma mangueira. E para o lado do mesmo vizinho, com o mesmo rosto tranquilo de sempre. Ele também havia dado suas cabeçadas, mas era bem mais esperto do que eu e não tinha ido até as últimas consequências.
Eu fui trabalhar na mesma escola em que estudei. E em que ele dava aulas de caratê. E do alto da sua maturidade de nascença, ele não deu ouvidos as fofocas, nem ao burburinho que se instalou. Ele me dava carona para casa, brincava com meus bebês e às vezes, muitas vezes, só sentava, debaixo daquela mesma mangueira e conversávamos por horas. Levou tempo para que eu tivesse coragem de agir. Mas o que me falta em sutileza, sobre em paciência a ele. Três anos depois de eu voltar para casa, Beto me pediu em casamento. Com um bebê no colo. E sorvete escorrendo na camisa. Não podia ser melhor.
Às vezes, só às vezes, o primeiro amor pode começar com um puxão de cabelos e durar 40 anos. Mesmo com alguns percalços no caminho e algumas viradas bruscas.
Esse post foi feito a convite da Elaine Gaspareto, no Blog dela, o delicioso Um Pouco de Mim. Que tal você contar sua história também?